Folha de coca e medicina andina: mitos e realidades

O uso da folha de coca nos países andinos é mais do que cultural, é medicina natural. As pessoas que vivem perto ou nas Cordilheiras dos Andes em países como o Chile, Bolívia, Argentina, Peru, e Equador, tiveram que se adaptar às altas altitudes e climas extremos para não adoecerem.

Para o nosso corpo humano, que precisa de oxigênio e água em abundância, parece contraintuitivo viver em locais tão altos e com muita seca. O uso de plantas regionais fez com que os andinos se adaptassem aos climas e pudessem viver perto da divindade deles, os Apus, as montanhas. Se você estiver preparando a sua viagem para o Chile, Bolívia, ou Peru, não esqueça de checar nossos artigos no blog com dicas para uma viagem inesquecível nos Andes!

Para entender como que eles enxergam a medicina ancestral, as plantas locais e o uso da tão polêmica e essencial folha de coca, preparamos um artigo com o que você precisa saber antes de viajar para um dos países andinos. Esse artigo foi escrito com pesquisa de dois artigos, um da Escuela de Medicina Humana, de Chiclayo no Perú; e a outra é o relatório “Ainda nos cuidamos com nossas medicinas”, da Comissão Andina de Saúde Intercultural.

A medicina natural é uma medicina, e como qualquer remédio, não podemos abusar do uso e muito menos negligenciar um diagnóstico mais aprofundado. Por isso, recomendamos conhecer as medicinas naturais para diminuir preconceitos, abrir nossas visões de mundo para outras culturas e jeitos de viver a vida, mas não deixar de contratar um seguro viagem e estar amparado.

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Como é a medicina natural andina?

A cosmovisão andina, que é como eles enxergam e veem o mundo, que nós e a natureza somos um só. Estamos tão interligadas que dependemos um do outro. Mais que isso, que fazemos parte de uma comunidade, que eles chamam de Ayllu. Cada um tem o seu Ayllu, sua rede de apoio e natureza que te cuida.

Esse é um dos pilares do Sumak Kawsay, que é traduzido ao português como Bem Viver. É um movimento coletivo social que preza a comunidade, se organizando politicamente para que todos tenham o que precisam para viver. E não só viver, mas viver bem.

Na medicina científica, estar doente é quando algo no nosso corpo está doendo, com alguma alteração, não está funcionando como deveria. Para a medicina andina, estar doente ou com algum mal-estar é ter um desequilíbrio entre o indivíduo, o ambiente em que ele está e o mundo espiritual. Por isso, muitas das medicinas incluem não somente chás, mas também rituais para se realinhar.

A vida em comunidade é um dos grandes pilares dos andinos. Em locais em que a natureza pode ser mais hostil, com a altitude elevada, entre secas e nevascas, estar em comunidade e cuidar um do outro garante a sobrevivência de todos. Por isso, estamos bem se o nosso entorno está bem, a natureza e as pessoas. Senão, nós não temos como ficar bem.

Cuidar da nossa própria saúde, então, é também cuidar dos outros e cuidar da natureza. Não existe autocuidado sem cuidar do outro.

Folha de Coca

A folha de coca é uma planta medicinal, ancestral e polêmica. Ela é encontrada nos países Peru, Bolívia, Chile, Argentina e Equador. Sobretudo nas cidades e povoados perto dos Andes, como San Pedro de Atacama, Uyuni, e Cusco, que são 3 das 4 cidades que oferecemos passeios.

A folha de coca é uma planta que, quando mastigada ou feita um chá, ajuda o corpo a se adaptar aos sintomas das altas altitudes. Por ser uma planta que está intimamente ligada à adaptação das populações andinas, ela também é usada em rituais espirituais. Sendo, portanto, uma folha sagrada.

Curiosidade: sabia que a coca era ingrediente da Coca-Cola em sua receita original? Foi apenas no começo do século passado que eles trocaram a coca por outro componente!

Benefícios da folha de coca

Assim como a quinoa, grão típico da região, é rica em proteína e ferro, a folha de coca oferece cálcio, potássio, magnésio, zinco e outros minerais. Em um lugar com menos recursos alimentícios, ter esse complemento por meio das folhas faz com que ela seja uma aliada nutricional para os ayllus, as comunidades andinas.

E não somente com nutrição, mas também como medicina. A folha de coca auxilia na digestão e dores de barriga, agindo contra gastrite e outras feridas. O mesmo serve para quando é esmagada e passada na pele, que funciona como um cicatrizante e analgésico. Além disso, uma pesquisa ainda revelou que ajuda até mesmo a combater as cáries e dores de dente.

Entre tantos benefícios, o seu maior uso é para combater o soroche, como chamam na região o mal de altitude. Quanto mais alto o corpo humano está em relação ao nível do mar, mais teremos sintomas. Entre eles, dor de cabeça, náusea, tontura, nariz sangrando, e falta de ar intensa.

A folha de coca tem princípios analgésicos e também ajuda a regular a pressão do corpo, fazendo com que nós nos adaptemos melhor à altitude. Por isso que indicamos um chá de coca de manhã aliado a muita água para aguentar a altitude. Ou ainda as mastigar em passeio de alta altitude, e longas caminhadas. Mesmo que tenha menos estimulantes que o café, também ajuda a combater o cansaço que vem com o mal de altitude.

Riscos da folha de coca

Nada em excesso faz bem, nem mesmo a medicina natural, que pode oferecer sintomas adversos quando abusamos. Igual a remédios de farmácia que precisam de dosagem, é tão importante tratarmos a medicina natural como a medicina que é. Os riscos oferecidos à saúde, quando usados em poucas quantidades, são mínimos.

Apenas não é indicada para quem tem pressão muito alta, porque ela age na pressão da corrente sanguínea. E nem para mulheres grávidas, pois ainda não se sabe os efeitos que pode causar no bebê. Na dúvida, consuma quando tiver soroche ou um cházinho para experimentar e se aclimatar. Como qualquer outra medicina, não abuse do uso.

Se você não quer usar a folha de coca para te auxiliar a se adaptar à altitude, recomendamos a chachacoma. É uma medicina natural andina também, mas seu efeito não é tão rápido igual ao da coca. Tem que tomar por alguns dias até sentir que aliviou o mal de altitude.

A folha de coca é uma droga?

Essa é a polêmica. Há décadas a folha de coca vem sendo estudada pela ciência para definir os benefícios e riscos da planta. Por outro lado, sem a folha de coca, não existiria a droga cocaína. Quando natural, a folha de coca não oferece riscos à saúde, oferece menos estimulante que um café.

Em 1961, a Convenção Única sobre Entorpecentes das Nações Unidas quis proibir as plantações de folhas de coca. Apenas décadas depois, fizeram pesquisas e concluíram que “o conteúdo do alcaloide cocaína na folha de coca está entre 0,5 a 1%”. Apesar de ter outros 13 alcaloides, todos também naturais e sem nenhum vínculo a drogas, a folha de coca foi alvo de campanhas para eliminar a planta.

Para se transformar em droga, a folha de coca precisa passar por um refinamento químico para ser transformada em pasta, e da pasta para cloridrato de cocaína, e por fim, cocaína. Ou seja, não é um processo nada simples. Mesmo assim, a folha de coca passou por campanhas de proibição em diversas partes do mundo e, principalmente, na América Latina, onde seu uso era, sobretudo, cultural e ritualístico.

Proibição e legalização da folha de coca

 A adição da folha de coca na lista entorpecentes internacionais segue sendo um forte golpe para as comunidades tradicionais andinas. Apesar de ter sido comprovado que a folha de coca quando consumida em poucas quantidades, como quando mastigadas ou em chás, não oferece riscos a saúde e nem vícios, segue sendo alvo de preconceitos.

Os países que fazem o uso tradicional e cultural da coca também aderiram às leis de plantio para fiscalização de tráfico. Isso quer dizer que eles têm áreas específicas para plantio, não podem ultrapassar os limites e não é permitido exportar. Como as comunidades tradicionais não precisam de muita coca, não tiveram problemas com a nova lei.

Os andinos seguem usando a folha para seus rituais de adoração às montanhas e chás para regular o corpo às altas altitudes. Assim como nós, turistas, que queremos conhecer a Cordilheira dos Andes de perto e recorremos a um chá ou bala de coca para regular nosso corpo. Os países seguem reformulando leis para que o plantio da coca seja o que é em origem, uma medicina cultural e ancestral andina.

Medicina natural andina

Assim como muitos países, o uso de plantas e folhas como medicina é milenar. Algo que eles aprendem na experiência e vão passando de geração em geração. As investigações hoje da medicina moderna com a medicina ancestral parte de um lugar de respeito às tradições culturais e de uma não anular o trabalho da outra.

Quem nunca ouviu a vó falar que para curar a dor de barriga basta um chá de boldo? Ou que pra cólica a folha de amora com camomila é tiro e queda? Dor de garganta então, limão com gengibre e alho são o combo perfeito. Tudo isso faz parte da nossa medicina natural. Agora, vamos conhecer um pouco da medicina andina.

• Chañar – Funciona como um expectorante quando o pulmão está carregado e alivia a tosse.
• Ricarica – Ajuda a diminuir a diarreia e melhora a saúde dos rins.
• Chachacoma – Indicada para quem está com muito catarro, com mal de altitude.
• Muña – Alivia a gastrite e outras dores no estômago e funciona como um suave broncodilatador, ajudando em doenças respiratórias.
• Llantén – Essa folha funciona como um vermífugo para alguns casos de parasitas. 
• Dente de leão – Indicada um chá de dente de leão para quem está com infecção urinária.
• Pupusa – Usada para quem sofre com insônias ou está muito ansioso e inquieto.
• Sábila (aloe vera) – Trata queimaduras e feridas da pele.
• Verbena – Propriedades anti-inflamatórias, usada pra febre.
• Manzanilla (camomila) – Digestão e calmante natural.

Gostou de saber mais sobre a história e os benefícios da folha de coca? Deixe aqui nos comentários se você já provou e o que achou dessa medicina ancestral. Para saber mais dos nossos passeios nos países andinos Chile, Bolívia e Peru, acesse esse link aqui para fazer o seu orçamento de viagem!